CERI TOH

Ceri toh quer dizer Seridó na língua indígena. O historiador Câmara Cascudo escreveu que Ceri toh significa sem folhagem, pouca folhagem, pouca sombra ou cobertura vegetal, segundo Coriolano de Medeiros...Também ouvi de meu pai que significa paisagem desnuda e gosto mais dessa expressão.
Segundo os judeus significa "refúgio Dele", originada da palavra hebraica she ´eritó, assemelhando-se muito com a palavra Seridó.
De qualquer forma, esta palavra está impregnada em mim desde tempos imemoriais...

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

CARTA POÉTICA


Como te dizer: noite, morte, escuridão se isso ainda é o que dá sentido a tudo? Teu nome estanca o assovio, o assombro e desperta dois nítidos corpos que atravessam a sala deixando unguento e matizes como rastros do que foi.
Não quero procurar-te como quem se perde, ameaçá-lo como quem espera uma concretude. Sempre te convences. Mas te enganas. Esse inquietante amor abriu-me portas pesadas onde me abrigo. E dentro dessa solidão passeio como quem colhe lírios. Fui mais completa quando tudo me faltou. Encontrei-me quando não mais me reconheci.
Olha ao teu redor...tudo é escombro. Porque és feito de mentira e de soberba. E mesmo que te retorcesse e sangrasse, nem mesmo assim te adiantaria. Porque os teus arredores são de escuras amarras, de amargas partidas, de negras funduras. Não sabes ainda dos teus adversos. Mas quando olhares teus arredores, quando eu te disser “te sei” e quando me disseres “te vejo”, te darás conta do grande e aterrorizante aguilhão que te aprisionas. E nada disso te adiantará. Porque serei tua dor, tua escrita, teu espinho, um punhado de sal sobre teu corte.

“E não haverá mais nada, negro amor.”

terça-feira, 11 de setembro de 2012

REENCONTRO





Marquei o encontro para às três da tarde. Não gosto de esperas, não sei o que fazer com as mãos deixadas sobre as coxas em total abandono. Minhas mãos me denunciam e eu não gosto de esperas. Sentei-me no banquinho da praça e aguardei  que ele aparecesse na esquina da rua com as mãos cheias de papel. Estou escrevendo um novo romance – confabulou no telefone – gostaria de te mostrar. Penso que este homem é louco. Enquanto vejo-o se aproximar, lembro do dia em que o conheci. Cara de escritorzinho barato. Desses que fumam o dia inteiro e bebem coca-cola sem gás. Dono de um sorriso mágico e de um beijo fantástico. Preciso experimentar – pensei. Dizem que escritores tem um quê a mais. Uma palavra decorada do livro de Clarice para dizer naquela hora em que fica difícil respirar. A frase queima e arrepia a pele. Ele também leu muitos livros sobre o amor, mais ainda sobre sexo. Deve saber das coisas esse menino com cara de homem.

Chegou e jogou os papéis no meu colo. Levei um susto, mas ele sempre foi assim- estabanado com as coisas. Nunca com o corpo. Este, ele conhece milímetro por milímetro. E o que fazer com os milímetros. Dono de uma voz rouca quando excitado. Hálito de menta. Cigarro de menta. Lembro do cheiro da pequena biblioteca onde nos beijamos a primeira vez.  Cansei de esperar que ele me beijasse. Enquanto me mostrava sua coleção de revistas, eu fui olhando hipnoticamente para sua boca e já nem ouvia o que ele falava, minha imaginação ia à mil imaginando o que aquela boca poderia fazer calada. Beijei-o demoradamente e fui empurrando-o contra a estante de livros. Colei em seu corpo. Senti seu desejo. Então escritores também desejam ardentemente na vida real, que bom. O beijo demorou demais e me desvencilhei daquela boca com uma desculpa qualquer.

O texto é realmente bom – falei pra quebrar o silêncio. Pedi um café, ele um suco. (Um suco, oh Deus). Perguntei se eu estava no romance, ele corou. Sim, eu era a prostituta do livro. Logo uma prostituta? Corei pensando nas vezes em que namoramos em locais públicos. Sim, ele era um louco e nos amávamos. Nos bares, nas esquinas, nos becos, nos banheiros públicos. Éramos loucos, jovens e loucos. Amávamos as noites, os dias, o apartamento. Cheiro de amor em tudo, até nos livros. Líamos juntos e terminávamos na cama. No banheiro. No sofá da sala. A barba grisalha mostra que envelheceu um pouco. Ficou mais bonito. Sua perna roça de leve a minha por baixo da mesa. Olho para ele e sorrio. Ele baixa os olhos. Sempre me encantou esse baixar de olhos. Estamos velhos para isso, você não acha? Você continua com os olhos de Capitu – ele me diz sorrindo. Conversamos sobre a vida, sobre as banalidades depois que a gente se separou naquela noite fria no lançamento do seu primeiro livro de poemas. Ele me apresentou um amigo. Eu lhe apresentei uma amiga. Saí cedo, ele tarde. O amigo me deixou em casa. Minha amiga terminou na casa dele. Na cama dele. Não nos falamos mais durante anos. Não falamos sobre isso. Meu café esfria na xícara. O suco esquenta. Eu começo a olhar hipnoticamente aquela boca que fala, fala e eu nem escuto mais o que diz. E como eu não sei esperar...